[leia-se "iá": sim. (eu falo alemão)]
Quer dizer, pelo menos tô tentando. Tentando muito! Em todas as minhas projeções sobre como seria meu tempo morando na Alemanha, ta aí uma coisa que eu realmente subestimei: a dificuldade que é estar em um lugar cuja língua você não domina.
Eu quis estudar alemão antes de decidir vir pra Alemanha, e na verdade acho que a escolha do país tem muito mais a ver com a paixão pela língua do que vice-versa. Fiz dois semestres de curso no SENAC - e amei! Minhas professoras, Claudia Dantas e Valquíria Barca, foram maravilhosas e me fizeram gostar ainda mais do idioma. E olha que não é fácil conseguir que o uma língua tãaaao difícil cative seus alunos. Mas aconteceu comigo. Caí perdidamente de amores.
Fazia tempo que eu não me sentia tão desafiada quanto quando comecei a estudar. Minha ideia de complexidade máxima era a prova de física do 2˚ ano do CEFET - que me fez suar pra tirar 8,8 no último bimestre e não reprovar. Depois de me deparar com a língua germânica, eu revi meus conceitos. E sim, essa é a minha empreitada mais difícil até agora.
Concluí os dois primeiros níveis com boas notas e vim pra cá bastante confiante de que morrer de fome eu não iria. Mas como já disse, eu realmente subestimei esse desafio. Aqui em casa, a Gast fala comigo apenas em alemão (e na rua, não preciso nem falar). Pra minha surpresa, eu entendo quase tudo que ela fala. Mas eu tenho cer-te-za que a força que eu faço interiormente pra me concentrar e captar as palavras é tão grande que eu acabo fazendo umas caras terríveis - de dúvida, de esforço, cara de quem está olhando pra um alienígena.
Meu problema maior realmente não é compreender. Mas (retomando a ansiedade que eu confessei ontem...) me angustia terrivelmente ter um monte de coisa na minha cabeça e não conseguir transformá-las em palavras para outras pessoas. Às vezes eu tenho a impressão e o medo de que os outros me achem desinteressada - ou pior, burra mesmo! No fundo - ou no raso - eu sei que não é isso, mas o pensamento não deixa de me assustar toda vez que eu ouço e entendo um relato complexo e respondo com uma frase. AAAAAAAHHHH! Pra alguém como eu, vocês devem entender o sufoco que é querer contar histórias ou pelo menos responder a perguntas de maneira mais complexa e ter que esbarrar na insuficiência da língua.
Eu sei. Paciência. Paciência... A minha eu devo ter jogado no lixo em algum lugar ainda na minha infância, porque desde que eu me entendo por gente eu não consigo subir uma escada pensando nela um degrau de cada vez. Alguém aí se solidariza ou eu tô ficando doida?
Desde que eu cheguei aqui, tanto a minha Gast quanto as outras pessoas que eu tenho conhecido têm insistentemente falado da qualidade do meu alemão. E eu não paro de achar que é mais bondade e incentivo do que realidade. A única pessoa que eu não consigo convencer sou eu mesma. A Gast acredita tanto no que me diz que ela me matriculou um nível acima do que eu deveria estar. Meu estômago estava embrulhado de nervoso até ontem, véspera do início das aulas.
Quase soltei um UFA alto quando, depois de alguns minutos de aula, percebi que eu não só consegui entender tudo, mas poderia até estar um tiquinho acima. Melhor assim, de qualquer forma. Antes revisar do que morrer do coração tendo que dar conta de um conteúdo que não posso acompanhar. A partir de hoje, serão 3 horas de aula de alemão por dia, de segunda a sexta. O que eu fiz em Natal em um ano, aqui eu vou fazer em um mês.
Sim, é maravilhoso saber que eu vou avançar tão rápido - ainda mais tendo o dia-a-dia inteirinho configurado na língua que estou aprendendo - mas hoje, já do primeiro dia, deu pra perceber que o preço a pagar vai ser altíssimo. Em Euros (ai, meu corassaum...) e em dedicação. Além das 3 horas de aula diárias, todos os dias temos atividades para casa. Fora a necessidade de revisar, repetir, voltar o conteúdo até o cimento endurecer!
Na sala de aula, já deu pra reconhecer França, Estados Unidos, Colômbia, México, Romênia, Geórgia, entre outros. E Brasil, claro! Porque onde existe mundo, existe um brasileiro! Fiquei até espantada em saber que só há um além de mim. As três meninas com quem conversei hoje, fora o compatriota, também estão aqui como Au Pair.
Além do custo bem alto do curso, hoje descobri que os livros que a Gast me emprestou e que me fizeram quase perder os punhos apagando as respostas não vão servir. Ou seja, mais números negativos na conta da minha pessoa. Na livraria, enquanto eu andava até o caixa, combinei uma coisa comigo mesma: não importa quanto o meu bolso vai ver indo embora, eu não vou reclamar por pagar pra investir em mim. Mesmo estando ainda dando os primeiros passos, eu já consigo visualizar o quão longe eu posso (e quero, quero MUITO) chegar. E se o alemão vai abrir o caminho, ele pode levar dezenas e centenas da minha conta enquanto eu tiver!
Estar aqui e ter essa perspectiva tão real é um presente. Vai ser barra acordar cedinho e viajar 40 minutos pro curso na hora do rush. Vai ser barra encarar três horas da mesma disciplina cinco vezes na semana. Vai ser barra me concentrar em uma aula que vai até 12:30 e saber que eu ainda estou a 40 minutos de distância - no mínimo - do meu almoço. Não podemos, amigos, deixar a comida de fora disso.
Mas vai ser lindo responder a pergunta do título cheia de propriedade daqui a alguns meses. Vai ser lindo encher a boca e - sem titubear - dizer: "Sim. Eu falo alemão".
Então hoje nada de beijo! Eu mando um kuss pra vocês ;)