Hallo, gente!
Hoje é feriado aqui em Munique. Exagerei da boa vida acordando quase às 10 da manhã. Depois do café, fui dar uma andada com minha Gast (Gastmutter = host mother/anfitriã) pra aproveitar o dia lindo de sol. Olhem que lugar fofo eu tenho pertinho de casa:
Na Suíça, assim que 2014 foi embora, começou a fazer sol. E sério, sol e neve é uma coisa linda demais! Não por muito tempo, na verdade, porque a neve derrete e vai ficando escura. Mas ainda assim, não tem como não amar o céu azul sobre o chão branquinho. Neve é daquelas coisas lindas, mas que dão trabalho. Imagina acordar todo dia com o carro assim:
Mas que é lindo, isso é! <3 |
Aproveitando o tempo lindo e os vouchers que ganhamos da mãe de Sarah, decidimos que o dia 2 seria dedicado às montanhas. E sem tem uma coisa na natureza que eu amo, mais do que qualquer outra, é montanha! Ou amava. Porque sério, em todo meu encantamento e admiração, eu jamais poderia prever o que Säntis e Kronberg reservavam para nós. Se eu alguma vez na minha vida relacionei montanhas a calmaria e tranquilidade, acho que vou pensar mil vezes da próximas vezes que esse tipo de ideia me ocorrer.
Começamos com Säntis, a montanha mais alta da região de Appenzell, com uma altitude tíiimida de 2,5km. Subimos em um teleférico, admirando pelas janelas de vidro a gigante nevada. Absolutamente maravilhosa!
O teleférico nos leva até um prédio de uns 6 andares, que começa com um pequeno museu sobre a montanha e os arredores e termina com um terraço exatamente no topo da montanha. Lá dentro tem uns dois ou três restaurantes, todos com vista panorâmica. Paramos primeiro em um andar intermediário. Do lado de fora, as pessoas lutavam contra o vento. Mas todo mundo rindo e achando maravilhoso. Abrimos a porta para e vimos que a luta era séria, mas nada que tirasse o nosso bom humor. Além do vento fortíssimo, o frio fazia todas as partes descobertas do corpo quase congelarem. Até falar era meio que um sacrifício. Com uma vista destas de presente, não há dúvidas de que valeu a pena:
Mas que é que vai a uma montanha e rejeita a oportunidade de chegar ao topo? Impossível! Subimos mais uns lances de escada até chegarmos no último andar. Ah, essa felicidade...
...que durou só até abrirmos a porta. Quando demos o primeiro passo, o chão era praticamente só gelo. Sem exagerar, dessa vez. O solado liso da minha bota não podia ser pior praquele tipo de piso, e com o vento soprando umas quinhentas vezes mais forte do que no andar abaixo, eu e Sarah segurávamos as mãos uma da outra freneticamente enquanto escorregávamos. Eu olhava pras duas barras de aço paralelas que nos ~protegeriam~ de uma queda daqueles singelos dois mil e quinhentos metros e só conseguia pensar em uma coisa: "eu to gordinha sim, mas eu tenho certeza absoluta que eu passo por entre essas barras!". E gente, vocês já viram aqueles desenhos animados em que as pessoas vão escorregando e voando por causa do vento? Sem tirar nem pôr, era assim que a gente estava! A câmera no meu pescoço, pesada, era a primeira a querer voar. A bolsa que eu estava carregando, meio redonda e sem zíper, inflava como um pára-quedas - mas eu tinha certeza eu ela não ia parar queda nenhuma minha, pelo contrário!
Mais treinada que eu, Sarah se movia muito mais rápido. E eu eventualmente BERREI - tanto pra falar mais alto que o vento quanto pra dar vazão ao meu desespero - pra ela andar mais devagar. E além do topo, tinha também o TOPO DO TOPO, e Sarah estava destinada a me levar até lá. Isso significava subir mais uma escada, mas dessa vez do lado de fora, fazendo equilibrismo no gelo e quase rastejando pro vento não me levar.
Quedinha na escada pra descontrair... |
A última vez que tinha ficado com medo de morrer foi no Quênia, quando peguei uma ameba (ok, ameba no Brasil ta de boa, mas se você nunca entrou em um hospital queniano, não queira nem saber). Na minha cabeça, eu já visualizava as manchetes de jornais falando sobre os corpos encontrados ao pé da montanha no dia seguinte. O medo foi tão grande que eu só me aventurei a tirar uma foto.
Quando finalmente, segurando nas paredes e aproveitando qualquer segundo de trégua do vento, conseguimos voltar pra dentro do prédio, nos olhamos perplexas. O que tinha sido aquilo? As gargalhadas que vieram a seguir foram, com certeza, mais de terror e alívio do que de graça.
Sentamos para tomar um chocolate quente e café mais que merecidos, pensando ter deixado todo o perigo para trás. Ó, ilusão! Ainda tínhamos uma montanha pra visitar, e tudo o que eu sabia era que nosso voucher dava direito a uma descida de sled. Eu já tinha feito sled uma vez, com meus sobrinhos, e estava animadíssima para fazer novamente. As doces imagens que eu tinha na minha cabeça ao pensar em sled eram assim...
Descobri a traição da minha ingenuidade assim que, chegando lá, Sarah me informou que eram 7km de descida. Engoli seco e não hesitei em continuar. Resolvemos almoçar ali mesmo, no restaurante ao pé da montanha, pra depois seguirmos em frente.
Observando as pessoas ao nosso redor, a conclusão - nossa e delas - era uma só: se havia naquela lugar duas pessoas inapropriadamente vestidas, éramos nós. Os jeans, jaquetas e botas regulares se destacavam em meio a uma multidão de roupas e equipamentos de neve. Quando estávamos finalmente na fila (enorme!), já chegando no teleférico, uma tiazinha à nossa frente me olhou de cima abaixo e deu aquele sorriso com a boca meio apertada. Aquele sorriso de pena.
Olhamos para cima, e o céu estava preto. Olhamos de novo, e a névoa cobria o topo da montanha. Não dava pra ver nada. Uns segundos depois, estava chovendo ali mesmo. Ótimo. Mas é claro que nenhuma de nós, cabeças duras, queria desistir. Entramos no teleférico e, a cada metro mais perto do pico, minhas pernas bambeavam mais. O que danado a gente estava fazendo ali?
Sem carteira ou dinheiro ou cartão nos bolsos, uma vez que estávamos no pico, só havia duas alternativa de descida: a pé ou de sled. Assim que fizemos nossa primeira tentativa a bordo do sled, extremamente frustrada, e contemplei o penhasco que estava sempre à nossa direita, sem proteção nenhuma, pensei que sim!, havia uma terceira alternativa para descer: levada pelos paramédicos, com pelo menos as duas pernas quebradas.
Os primeiros trinta minutos foram cabulosos, assustadores. A gente não conseguia dirigir aquela coisa de jeito nenhum! Sempre acabávamos indo para a direita, perto demais de rolarmos montanha abaixo. Nesse trecho inicial, o declive era grande mesmo, e realmente não havia muita neve desse lado direito da pista - nosso ponto fraco. Só depois é que a pista foi se estendendo mais pelos lados e dava pra sentir um certo alívio sabendo que, se caíssimos, cairíamos sobre a neve.
Cada vez que tentávamos deslizar mais um pouco, acabávamos perdendo o controle e caindo uma por cima da outra, e ambas por cima do sled, ou o contrário. Eu queria sentar e chorar. Apenas isso. E eu sei que Sarah também. Nenhuma de nós poderia prever que seria daquele jeito - ainda assim, assumimos que foi muita ingenuidade ter pensado que não teríamos problemas ali. Decidimos ir andando, e eu me movia na velocidade de uma anta com as quatro patas machucadas. O branco da neve doía nos olhos, eu via aura (aqueles pontos e figuras brilhantes) o tempo todo e estava só esperando o momento de torcer o calcanhar andando sobre o gelo com a minha bota DE SALTO (minha gente, DE SALTOOOO! não alto o suficiente pra eu ser a Gisele Bündchen, mas alto o suficiente pra incomodar).
Depois dessa meia hora, paramos em um restaurante pra eu ir ao banheiro. Olhei ao redor tentando reconhecer algum outro meio de transporte, mas nada. Quando pegamos a estrada nevada mais uma vez, as coisas começaram a melhorar. Eu descobri que podia ajudar a guiar o sled colocando minha mão nos apoios traseiros, em vez de deixar os braços na cintura de Sarah. O maior desafio de toda tentativa de descida era nos mantermos na pista e sobrevivermos aos "quebra-molas" que se formam nela. Não é divertido, não é engraçado. É doloroso. Um deles foi gigante o suficiente para mandar Sarah voando, mergulhando de boca na neve, e eu admito que ri com a cena. Desculpa, amiga!. (Chegando lá embaixo, ela contou que um deles foi gigante o suficiente pra quebrar uma vértebra de uma amiga ela - que graças a Deus não teve sequelas. Fiquei aliviada por ela ter me contado isso depois que sobrevivemos). Em um outro momento, passamos por tantas ondas e levantamos tanta neve que o rosto e a jaqueta de Sarah e ficaram completamente cobertos de neve. Ri disso também. Alto! E o que dizer da hora em que ela disse que estava fazendo xixi nas calças por causa do balanço? Amiga, me perdoa!
O cansaço maior estava nas pernas, sem dúvida. Além de mantê-las estendidas enquanto deslizávamos, elas eram nosso volante e nosso freio. E acredite em mim, você não vai querer saber o quanto dói ter seu calcanhar insistentemente esmagado em uma velocidade relativamente alta - ainda mais usando uma bota DE SALTO (onde eu estava com a cabeça?). A gente foi aos poucos se acostumando com as quedas e melhorando sutilmente nossas habilidades com o sled, mas ainda estava muito difícil. A chuva foi ficando mais forte. Eu vestia duas camadas de calças, mas Sarah tinha apenas uma. Seu jeans já estava encharcado, e em um momento ela confessou que não estava sentindo as pernas. Tava caro o preço a pagar pelas nossas cabeças duras.
Em um momento a gente de fato parou, contemplando o fracasso, e, sentadas no sled, oramos. Sério. Já estava desgastante demais, física e emocionalmente. Se não fosse Deus, quem mais ia ajudar a gente a descer? E de verdade, as coisas mudaram muito a partir dali! Conseguíamos guiar o sled por muito mais tempo (chegamos a dois minutos!), conseguíamos rir das nossas trapalhadas e depois que as coisas ficaram legais percebemos o quanto éramos sortudas de estarmos ali juntas. Tenho muitas amigas que, mesmo sendo maravilhosas e estarem no meu coração, não lidariam com aquela situação do jeito que Sarah lidou. Se fosse passar por isso de novo e tivesse que escolher alguém pra ir junto, eu tiraria a mesma Sarah da minha Pokébola. <3 A gente tava completamente focada na missão de chegar lá embaixo. E a animação chegou ao ponto de tirarmos foto! Uhul!
Quando chegamos lá embaixo, mal podíamos acreditar que finalmente havia terminado! Deve ter levado umas duas horas pra gente descer, mas nos momentos mais difíceis parecia uma eternidade nada agradável. Sério, que alegria quando terminou tudo... e que dor! Meus tornozelos ainda sofrem como se tivesse sido ontem, e Sarah ficou com uns roxos nas pernas que provavelmente não vai sair tão cedo. É engraçado que, naquele dia, eu estaria indo pra Munique, mas minha Gast teve um compromisso e precisamos adiar pro dia seguinte. Nada daquilo teria acontecido se o plano original tivesse dado certo. E de verdade, eu prefiro mil vezes do jeito que foi!
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Clique na foto pra ver o vídeo! \o/ |
Se eu iria nas montanhas de novo? Com certeza! Mas no verão :D Hehehe...
É isso, gente! Tô vivíssima e adoro ter mais uma história pra contar. Amanhã eu falo da chegada em Munique e podemos finalmente colocar o blog com os dois pés (oi?) na Alemanha.
Beijo!