19 de janeiro de 2015

presente de Natal

Servus, todo mundo!

Sim, é com essa palavra (bem feinha, na minha opinião) que se cumprimenta amigos ou pessoas próximas aqui na Baviera - ou, no português incorreto, Bavária - estado alemão cuja capital é Munique. Tenho percebido cada vez mais que os bávaros têm o maior orgulho de serem daqui, e no último fim de semana eu conheci um pouquinho mais da tradição que para eles é um tesouro.

Eu sei que minha última história sobre montanhas por aqui foi meio cabulosa. Na de hoje, o cenário é bem diferente: um hotel/estação de ski a quase 2 mil metros de altitude, localizado nos alpes alemães. Passar um fim de semana lá foi o presente que minha Gast me deu de Natal - e que presente! Valeu a pena esperar! Todos os anos, minha Gast e Kind e outras 5 ou 6 famílias que têm alguma conexão com o Brasil (seja por um dos pais, por terem morado lá ou por afinidade mesmo) se encontram nesse hotel para esquiarem juntos. As crianças das famílias estudaram juntas em um jardim de infância brasileiro e até hoje mantêm contato principalmente através desse encontro. Muito legal, né?

Saímos daqui na sexta-feira, no início da noite. Assim que estávamos fora da cidade e chegamos na Autobahn, a Gast acelerou com tudo e meu estômago foi na boca - demorei a lembrar que, numa rodovia alemã, velocidade máxima é uma coisa quase que inexistente. Aliás, na minha lista de coisas pra fazer por aqui, está o item alugar um carro potente e afundar o acelerador numa Autobahn. Só não fala isso pros meus pais, por favor.

Depois de mais ou menos uma hora na estrada, chegamos ao lugar onde o carro ficaria estacionado. Um pouco antes de sairmos de casa, quando a Gast sugeriu que eu trocasse uma malinha de ombro por uma mochila que ela me emprestaria, achei que fosse um cuidado mais pelo conforto do que por precaução. Eu sabia que, depois do trajeto, a gente teria que andar cerca de uma hora até o hotel. Mas Tico e Teco foram incompetentes o suficiente para não calcularem que, em se tratando de uma montanha, andar - no caso da ida - significa necessariamente subir. Depois dos primeiros cinco minutos, eu já jurei gratidão eterna à Gast pela mochila. Sério, antes de tudo, se tem uma coisa que essa viagem me ensinou, é que eu preciso urgentemente recuperar a forma física - uma forma mais parecida com um ser humano saudável do que com uma circunferência, nesse caso.

Num frio de lascar e lutando a cada passo para não me esborrachar no chão, que era uma mistura de gelo e neve, fui no caminho conversando com Ana Lúcia, uma brasileira do Maranhão que já está aqui há uns 14 anos e é mãe de uma das melhores amigas da minha Kind. Quando finalmente chegamos ao hotel, eu estava com todos os bofes pra fora. Essa foi minha primeira visão:


Até aí, eu não tinha noção de como era o lado de fora. O caminho até o topo era escuro, e as poucas luzes não deixavam a gente ver muita coisa à nossa frente ou dos lados. Só no dia seguinte eu descobriria onde é que eu estava mesmo! O hotel é uma casa bem grande e toda de madeira, com uma decoração bastante rústica e tipicamente bávara. Lindo, lindo!
A frente do Hotel - que eu só enxerguei mesmo no dia seguinte :P
Lá tem quartos privados ou compartilhados. E, como fomos em grupo, ficamos em um quarto com umas 10 camas. Quando cheguei para escolher a minha, entre umas 4 opções, que cama eu peguei? A que estava embaixo de uma goteira e tinha uma janela aberta em cima, obviamente! A primeira noite foi uma pagação de promessas. Como esse quarto não tem aquecimento praticamente nenhum, a primeira sensação ao deitar na cama é de estar pelado em um iglu. Tem que ser paciente pra esperar o seu corpo esquentar a cama e depois ela esquentar você. E eu, além de eu não estar agasalhada o suficiente, havia tomado um remédio pra enxaqueca que é cafeína pra dar e vender. Quase não consegui dormir a noite toda :'(

Acordei mais ou menos às 8h e corri pra tomar um banho bem quentinho. Quando desci e me deparei com um café da manhã fartíssimo (e com pãaaaao fraaaan cêeeeeeessss!!!!!!!!) tive a confirmação de estar no lugar certo. Comi horrores, repeti horrores e descobri uma nova delícia pra virar fã: suco de damasco. Me sinto até meio rica falando em suco de damasco, fruta que no Brasil é iguaria, mas aqui isso é bem comum!

Como eu e a Ana não tínhamos roupa de esquiar, nos programamos para darmos uma caminhada no entorno e passarmos um dia bem preguiçoso (que para minha alegria incluiu uma soneca de umas três horas no meio da tarde. Tudo que eu precisava!). Um pouco depois do café da manhã, descemos do Obere Firstalm (parte da montanha onde fica o hotel) para o Untere Firstalm. Nos primeiros dez metros de caminhada, caí de bunda no chão três vezes. E infelizmente, amiguinhos, não estou exagerando. Quando consegui me equilibrar nas duas pernas e, depois de uma descida bem chatinha, chegamos ao Untere Firstalm, tomamos um Glüwein branco e reunimos coragem pra caminhar na neve. E haja neve!

Só quero uma casa nas montanhas. SÓ.
Ficamos mais ou menos 1h45 andando pela montanha,  e quando voltamos fizemos um pique-nique-de-quarto com linguiça, queijo, pão e cracker de gergilim. Quase não dá pra ficar mais alemão do que isso! Depois de um banho quentinho, dormi horrores pra compensar a noite anterior. E como gordinho que é gordinho acorda bem na hora das refeições, abri um sorrisão ao constatar que o relógio já marcava 18h30 e em pouco tempo eu poderia jantar. A escolha para a noite foi um Wildgoulash, um prato sensacional de carne de veado (desculpa, Bambi, me desculpa!). Babem, amigos. É ainda melhor do que parece na foto:


Dormi feliz pelo Wildgoulash e já pensando no café da manhã do dia seguinte. Mais aquecida, dessa vez dormi que foi uma beleza! Fui tomar um banho pela catupilhonésima vez e ---pausa pra uma nota cultural. A gente tem a ideia de que no Brasil é tudo um oba-oba danado, mas uma característica das mulheres alemãs me pegou de surpresa aqui: gente, ELAS TIRAM A ROUPA NA MAIOR! No quarto compartilhado onde estávamos, sempre tinha alguma se trocando como se não houvesse ninguém ao redor (claro, nesse caso com calcinha/sutiã pelo menos). E no banheiro, eu notei que era a única a não ignorar a cortina que estava ali para cobrir o box transparente do chuveiro. Okay, né?

Enfim. No dia seguinte, fomos todos presenteados com sol e céu azul - claro que o frio permaneceu o mesmo, mas não dá pra negar o efeito que o sol tem no nosso humor. É muito bom! Pela manhã quem era de ski foi de ski. Fiquei com uma vontade louca de esquiar também, claro, mas sem equipamento nenhum fica meio... impossível. Deixa pro próximo inverno :) Tenho certeza que a neve está com saudade do meu talento incrível para o esporte, conforme demonstrado em 2010 na Suíça:



Ah! Uma das coisas mais maravilhosas desse fim de semana foi o contato com cachorros. Eu não podia ver um que já corria para derramar toda a minha carência causada pela saudade do meu filhote. Sério, eu vivo sem televisão, sem microondas, sem um monta de coisa. Mas sem cachorro não dá! Preciso urgentemente encontrar amigos aqui em Munique que tenham dogs porque aí vou na casa deles fingindo que quero visitar as pessoas quando na verdade tudo que quero é passar tempo com seus cachorros

Depois de muitas fotos e muita conversa, já tava na hora de almoçar pra ir embora. Escolhi, mais uma vez, um prato bem típico da Baviera: Speckknödelsuppe. O Knödel é essa bola gigante aí embaixo, e que vocês também viram no prato do Wildgoulash. Quando eu vi pela primeira vez, o que pensei? Noooooossa, uma almôndega gigante! E gente...
Que surpresa a minha ao descobrir que isso é... pão. Pão velho, ensopado, amassado e recheado até virar uma massa com alto poder de entupibilidade deliciosamente deliciosa! Ainda mais esse da sopa, que tinha bacon dentro. E gente...
Hihihi :D Sério, muito bom mesmo! E pra gastar o que foi ganho, mochila nas costas porque estava na hora de descer a montanha. E como o céu estava azul e o sol brilhando, eu finalmente veria o caminho pelo qual passei na sexta-feira à noite. E nossa. Que coisa mais linda! Acho que não preciso nem falar muita coisa...
Por esse caminho as pessoas também descem de sled, como eu e Sarah tentamos fazer lá na Suíça - com um êxito bem próximo de ZERO. Deu vontade de tentar de novo! Minha parte preferida da descida foi quando as nuvens começaram a baixar e virar uma névoa cada vez mais densa. Cenário de filme!
Quase 2,5km depois e 700 metros mais próximos do nível do mar, se encerrava ali nosso fim de semana nas montanhas de Spitzingsee. Além das memórias lindas - tanto as visuais quanto as gastronômicas - trouxe de recordação uma dor bem típica de quem há muito tempo não se exercita tanto: aquela que vai do dedo do pé aos últimos fios de cabelo.

Eu geralmente relaciono a Alemanha muito mais às casinhas típicas, aos espaços urbanos mega modernos, aos seus livros, sua História e às suas máquinas. Foi lindo esse primeiro encontro com a natureza daqui. E eu mal posso esperar pelo próximo...

Tenha uma semana schön, gente! E até mais :)

12 de janeiro de 2015

sprichst du Deutsch?

- Ja.
[leia-se "iá": sim. (eu falo alemão)]

Quer dizer, pelo menos tô tentando. Tentando muito! Em todas as minhas projeções sobre como seria meu tempo morando na Alemanha, ta aí uma coisa que eu realmente subestimei: a dificuldade que é estar em um lugar cuja língua você não domina.

Eu quis estudar alemão antes de decidir vir pra Alemanha, e na verdade acho que a escolha do país tem muito mais a ver com a paixão pela língua do que vice-versa. Fiz dois semestres de curso no SENAC - e amei! Minhas professoras, Claudia Dantas e Valquíria Barca, foram maravilhosas e me fizeram gostar ainda mais do idioma. E olha que não é fácil conseguir que o uma língua tãaaao difícil cative seus alunos. Mas aconteceu comigo. Caí perdidamente de amores.

Fazia tempo que eu não me sentia tão desafiada quanto quando comecei a estudar. Minha ideia de complexidade máxima era a prova de física do 2˚ ano do CEFET - que me fez suar pra tirar 8,8 no último bimestre e não reprovar. Depois de me deparar com a língua germânica, eu revi meus conceitos. E sim, essa é a minha empreitada mais difícil até agora.

Concluí os dois primeiros níveis com boas notas e vim pra cá bastante confiante de que morrer de fome eu não iria. Mas como já disse, eu realmente subestimei esse desafio. Aqui em casa, a Gast fala comigo apenas em alemão (e na rua, não preciso nem falar). Pra minha surpresa, eu entendo quase tudo que ela fala. Mas eu tenho cer-te-za que a força que eu faço interiormente pra me concentrar e captar as palavras é tão grande que eu acabo fazendo umas caras terríveis - de dúvida, de esforço, cara de quem está olhando pra um alienígena.


Meu problema maior realmente não é compreender. Mas (retomando a ansiedade que eu confessei ontem...) me angustia terrivelmente ter um monte de coisa na minha cabeça e não conseguir transformá-las em palavras para outras pessoas. Às vezes eu tenho a impressão e o medo de que os outros me achem desinteressada - ou pior, burra mesmo! No fundo - ou no raso - eu sei que não é isso, mas o pensamento não deixa de me assustar toda vez que eu ouço e entendo um relato complexo e respondo com uma frase. AAAAAAAHHHH! Pra alguém como eu, vocês devem entender o sufoco que é querer contar histórias ou pelo menos responder a perguntas de maneira mais complexa e ter que esbarrar na insuficiência da língua.

Eu sei. Paciência. Paciência... A minha eu devo ter jogado no lixo em algum lugar ainda na minha infância, porque desde que eu me entendo por gente eu não consigo subir uma escada pensando nela um degrau de cada vez. Alguém aí se solidariza ou eu tô ficando doida?

Desde que eu cheguei aqui, tanto a minha Gast quanto as outras pessoas que eu tenho conhecido têm insistentemente falado da qualidade do meu alemão. E eu não paro de achar que é mais bondade e incentivo do que realidade. A única pessoa que eu não consigo convencer sou eu mesma. A Gast acredita tanto no que me diz que ela me matriculou um nível acima do que eu deveria estar. Meu estômago estava embrulhado de nervoso até ontem, véspera do início das aulas.

Quase soltei um UFA alto quando, depois de alguns minutos de aula, percebi que eu não só consegui entender tudo, mas poderia até estar um tiquinho acima. Melhor assim, de qualquer forma. Antes revisar do que morrer do coração tendo que dar conta de um conteúdo que não posso acompanhar. A partir de hoje, serão 3 horas de aula de alemão por dia, de segunda a sexta. O que eu fiz em Natal em um ano, aqui eu vou fazer em um mês.

Sim, é maravilhoso saber que eu vou avançar tão rápido - ainda mais tendo o dia-a-dia inteirinho configurado na língua que estou aprendendo - mas hoje, já do primeiro dia, deu pra perceber que o preço a pagar vai ser altíssimo. Em Euros (ai, meu corassaum...) e em dedicação. Além das 3 horas de aula diárias, todos os dias temos atividades para casa.  Fora a necessidade de revisar, repetir, voltar o conteúdo até o cimento endurecer!

Na sala de aula, já deu pra reconhecer França, Estados Unidos, Colômbia, México, Romênia, Geórgia, entre outros. E Brasil, claro! Porque onde existe mundo, existe um brasileiro! Fiquei até espantada em saber que só há um além de mim. As três meninas com quem conversei hoje, fora o compatriota, também estão aqui como Au Pair.

Além do custo bem alto do curso, hoje descobri que os livros que a Gast me emprestou e que me fizeram quase perder os punhos apagando as respostas não vão servir. Ou seja, mais números negativos na conta da minha pessoa. Na livraria, enquanto eu andava até o caixa, combinei uma coisa comigo mesma: não importa quanto o meu bolso vai ver indo embora, eu não vou reclamar por pagar pra investir em mim. Mesmo estando ainda dando os primeiros passos, eu já consigo visualizar o quão longe eu posso (e quero, quero MUITO) chegar. E se o alemão vai abrir o caminho, ele pode levar dezenas e centenas da minha conta enquanto eu tiver!

Estar aqui e ter essa perspectiva tão real é um presente. Vai ser barra acordar cedinho e viajar 40 minutos pro curso na hora do rush. Vai ser barra encarar três horas da mesma disciplina cinco vezes na semana. Vai ser barra me concentrar em uma aula que vai até 12:30 e saber que eu ainda estou a 40 minutos de distância - no mínimo - do meu almoço. Não podemos, amigos, deixar a comida de fora disso.

Mas vai ser lindo responder a pergunta do título cheia de propriedade daqui a alguns meses. Vai ser lindo encher a boca e - sem titubear - dizer: "Sim. Eu falo alemão".

Então hoje nada de beijo! Eu mando um kuss pra vocês ;)

11 de janeiro de 2015

8 dias, esperança e feijão

Hallo, todo mundo!

Hoje faz 8 dias - já oito dias! - que eu cheguei em Munique. Por um lado, está tudo tão novinho que realmente parece que só faz um pouco mais de uma semana. Ao mesmo tempo, eu me sinto tão bem por estar aqui que me surpreendo que tenham se passado apenas oito dias.

Essa primeira semana foi muito tranquila em todos os aspectos. No domingo, meu primeiro dia aqui, saí com minha Gast para dar uma caminhada de casa até o centro - e sério, é muito perto, e o caminho é lindo! Sou privilegiada por morar onde estou morando. À noite fomos... cof cof cof... à Ópera. Sim, eu sou muito phynna. Mentira, fiquei suando frio quando cheguei lá e vi um monte de gente vestida como se fosse ver a Merkel em pessoa enquanto eu estava bem básica, como sempre! Eu, a Gast, a Kind (é assim que vou me referir à menina da qual sou au pair - sem nomes próprios ;D), duas amigas delas e uma outra mãe fomos ao simplório Teatro Nacional de Munique para assistirmos Hansel e Gretel. Gente, que fofura! A ópera foi linda demaaaais! Claro que eu entendi tudo muito mais pelo visual do que pelas palavras, mas valeu. E o teatro... sem comentários. É esplêndido!

Não, não é a Lua cheia. É o meu rosto.
O decorrer da semana foi tão tranquilo quanto o início dela. A Gast foi aos poucos me mostrando a rotina da casa, e quando fez sol demos um pulinho lá fora de novo. Ainda vou explicar melhor como funciona o programa de au pair e dar mais uns detalhes sobre meu dia-a-dia de trabalho aqui, mas o que adianto por enquanto é que minha rotina vai ser bem mais leve do que eu imaginava que seria. Ufa!

É interessante como eu só me sinto confortável ou pertencente à um lugar quando eu saio sozinha. Enquanto estou com alguém, sempre tenho a sensação de estar sendo guiada - uma coisa mais pra turista do que pra residente. Por isso mesmo ontem, quando eu me aventurei a sair sozinha pela primeira vez, eu me senti no topo do mundo. Eu passava pelas ruas sorrindo largo e sem me preocupar em esconder. Foi, até agora, meu momento mais real com Munique. O momento em que mais senti que este é meu lugar por enquanto e que eu estou realmente feliz nele. E sério... que sensação boa!


Hoje pela manhã eu fui à igreja pela primeira vez. Apesar de parecer muito mais prático, não quero ceder ao conforto de ir pra uma igreja brasileira ou com mais brasileiros do que locais - dentro do que eu quero alcançar em Munique, isso seria estar aqui sem estar de verdade, sem colocar os dois pés. Por isso, mesmo com uma oferta até grandinha de cultos em português, procurei um que fosse em alemão. Resolvi visitar a ICF, uma igreja internacional e que tem um estilo bem parecido com o da Hillsong. Cheguei um pouquinho atrasada porque foi meio difícil de encontrar a entrada, mas quando entrei, sentei, olhei pro meu lado direito e vi uma câmera na mesma posição da que eu operava na Hillsong em Londres, meu coração acelerou. Não sei se foi mais de saudade ou de vontade de participar, mas eu sei que acelerou. O culto foi lindo, e eu com certeza vou querer voltar.

Saudade da minha câmera...
Saindo de lá, peguei o trem pra visitar uma amiga querida que se mudou pra cá ano passado com a família. Alessandra foi minha professora de inglês no CCAA (láaaa pra 2006, 2007...) e depois nos tornamos colegas de trabalho, quando eu comecei a ensinar lá também. Quando resolvi vir para Munique, não tinha ideia de que ela estava tão pertinho daqui, e fiquei realmente feliz em saber que - mesmo tendo acabado de chegar - eu já tenho uma família. E uma família com uma história maravilhosa pra contar! O caminho de trem até é uma fofura, passa por muitas cidadezinhas bem típicas e rurais.



Conhecer a história de como Deus abriu as portas para Alessandra, Carlos, Davi e Débora chegarem onde estão foi uma injeção de esperança. Foram tantos milagres - grandes e pequenos - no meio do caminho deles, que não tive como não me sentir contagiada e cheia de ânimo pelo que está por vir. Eu sou extremamente ansiosa e por favor não me julguem mas desde que cheguei aqui já estou roendo as unhas, pensando nos próximos passos. E quando acabar meu tempo como au pair? E se acabar o dinheiro? E se eu tiver que voltar pro Brasil? E se meu alemão não ficar bom o suficiente? Às vezes eu tenho que dar uma sacudida em mim mesma e me lembrar que minha história com Munique começou agora, tá cedo demais pra eu perder o sono pensando no amanhã. E é por isso mesmo que ouvir o relato da trajetória da família Santos me lembrou de como Deus tem sido fiel comigo até aqui, e reafirmou no meu coração a certeza de que

 desde os tempos antigos ninguém ouviu,
nenhum ouvido percebeu,
e olho nenhum viu outro Deus, além de ti,
que trabalha para aqueles
que nele esperam.
(Isaías 64:4)

Recomendo de verdade que vocês curtam a página deles no Facebook e fiquem a par dos próximos passos dessa família que tem coração gigante (clique na foto para visitar a página!).


E além da conversa, dos abraços e dos sorrisos, minha gente... pelas caridades, teve FEIJÃO. FEI. JÃO! F-E-I-J-Ã-O! E não só isso! Arroz, farofa, carne, salada com gosto de Brasil. Claro que eu comi sem cerimônias e sem pensar no dia de amanhã (que aliás, oficialmente, é quando a dieta começa. Aham...). À tarde chegaram mais algumas amigas delas e levaram pizza. Nem pensei em resistir, obviamente, e dei lugar à toda a monstruosidade que habita em mim. Eu nem devia mencionar isto, aliás, mas ontem eu tava falando no Skype com meu pai e ele disse que eu estava com cara de chôro. Depois de eu negar mil vezes, chegamos à conclusão que é cara de quem engordou umas 15 toneladas desde que chegou. Haja queijo! Haja pão! Vergonha na cara que é bom, zero.

Depois de um dia maravilhoso, cheguei de volta em Munique já por volta das 19h30. Fui recebida calorosamente por minha Gast e minha Kind e comemos fondue. É impressão minha ou eu só falo de comida?

Amanhã começa um desafio novo pra mim: 3 horas de aula de alemão todos os dias. Tô meio nervosa pro meu primeiro dia de aula, admito, mas volto aqui assim que puder pra contar se eu sobrevivi e como foi :)

Um beijo!

6 de janeiro de 2015

montanha abaixo

Hallo, gente!

Hoje é feriado aqui em Munique. Exagerei da boa vida acordando quase às 10 da manhã. Depois do café, fui dar uma andada com minha Gast (Gastmutter = host mother/anfitriã) pra aproveitar o dia lindo de sol. Olhem que lugar fofo eu tenho pertinho de casa:


Na Suíça, assim que 2014 foi embora, começou a fazer sol. E sério, sol e neve é uma coisa linda demais! Não por muito tempo, na verdade, porque a neve derrete e vai ficando escura. Mas ainda assim, não tem como não amar o céu azul sobre o chão branquinho. Neve é daquelas coisas lindas, mas que dão trabalho. Imagina acordar todo dia com o carro assim:


Mas que é lindo, isso é! <3
Aproveitando o tempo lindo e os vouchers que ganhamos da mãe de Sarah, decidimos que o dia 2 seria dedicado às montanhas. E sem tem uma coisa na natureza que eu amo, mais do que qualquer outra, é montanha! Ou amava. Porque sério, em todo meu encantamento e admiração, eu jamais poderia prever o que Säntis e Kronberg reservavam para nós. Se eu alguma vez na minha vida relacionei montanhas a calmaria e tranquilidade, acho que vou pensar mil vezes da próximas vezes que esse tipo de ideia me ocorrer.

Começamos com Säntis, a montanha mais alta da região de Appenzell, com uma altitude tíiimida de 2,5km. Subimos em um teleférico, admirando pelas janelas de vidro a gigante nevada. Absolutamente maravilhosa!



O teleférico nos leva até um prédio de uns 6 andares, que começa com um pequeno museu sobre a montanha e os arredores e termina com um terraço exatamente no topo da montanha. Lá dentro tem uns dois ou três restaurantes, todos com vista panorâmica. Paramos primeiro em um andar intermediário. Do lado de fora, as pessoas lutavam contra o vento. Mas todo mundo rindo e achando maravilhoso. Abrimos a porta para e vimos que a luta era séria, mas nada que tirasse o nosso bom humor. Além do vento fortíssimo, o frio fazia todas as partes descobertas do corpo quase congelarem. Até falar era meio que um sacrifício. Com uma vista destas de presente, não há dúvidas de que valeu a pena:



Mas que é que vai a uma montanha e rejeita a oportunidade de chegar ao topo? Impossível! Subimos mais uns lances de escada até chegarmos no último andar. Ah, essa felicidade...


...que durou só até abrirmos a porta. Quando demos o primeiro passo, o chão era praticamente só gelo. Sem exagerar, dessa vez. O solado liso da minha bota não podia ser pior praquele tipo de piso, e com o vento soprando umas quinhentas vezes mais forte do que no andar abaixo, eu e Sarah segurávamos as mãos uma da outra freneticamente enquanto escorregávamos. Eu olhava pras duas barras de aço paralelas que nos ~protegeriam~ de uma queda daqueles singelos dois mil e quinhentos metros e só conseguia pensar em uma coisa: "eu to gordinha sim, mas eu tenho certeza absoluta que eu passo por entre essas barras!". E gente, vocês já viram aqueles desenhos animados em que as pessoas vão escorregando e voando por causa do vento? Sem tirar nem pôr, era assim que a gente estava! A câmera no meu pescoço, pesada, era a primeira a querer voar. A bolsa que eu estava carregando, meio redonda e sem zíper, inflava como um pára-quedas - mas eu tinha certeza eu ela não ia parar queda nenhuma minha, pelo contrário!

Mais treinada que eu, Sarah se movia muito mais rápido. E eu eventualmente BERREI - tanto pra falar mais alto que o vento quanto pra dar vazão ao meu desespero - pra ela andar mais devagar. E além do topo, tinha também o TOPO DO TOPO, e Sarah estava destinada a me levar até lá. Isso significava subir mais uma escada, mas dessa vez do lado de fora, fazendo equilibrismo no gelo e quase rastejando pro vento não me levar.

Quedinha na escada pra descontrair...
A última vez que tinha ficado com medo de morrer foi no Quênia, quando peguei uma ameba (ok, ameba no Brasil ta de boa, mas se você nunca entrou em um hospital queniano, não queira nem saber). Na minha cabeça, eu já visualizava as manchetes de jornais falando sobre os corpos encontrados ao pé da montanha no dia seguinte. O medo foi tão grande que eu só me aventurei a tirar uma foto.



Quando finalmente, segurando nas paredes e aproveitando qualquer segundo de trégua do vento, conseguimos voltar pra dentro do prédio, nos olhamos perplexas. O que tinha sido aquilo? As gargalhadas que vieram a seguir foram, com certeza, mais de terror e alívio do que de graça.


Sentamos para tomar um chocolate quente e café mais que merecidos, pensando ter deixado todo o perigo para trás. Ó, ilusão! Ainda tínhamos uma montanha pra visitar, e tudo o que eu sabia era que nosso voucher dava direito a uma descida de sled. Eu já tinha feito sled uma vez, com meus sobrinhos, e estava animadíssima para fazer novamente. As doces imagens que eu tinha na minha cabeça ao pensar em sled eram assim...


Descobri a traição da minha ingenuidade assim que, chegando lá, Sarah me informou que eram 7km de descida. Engoli seco e não hesitei em continuar. Resolvemos almoçar ali mesmo, no restaurante ao pé da montanha, pra depois seguirmos em frente.


Observando as pessoas ao nosso redor, a conclusão - nossa e delas - era uma só: se havia naquela lugar duas pessoas inapropriadamente vestidas, éramos nós. Os jeans, jaquetas e botas regulares se destacavam em meio a uma multidão de roupas e equipamentos de neve. Quando estávamos finalmente na fila (enorme!), já chegando no teleférico, uma tiazinha à nossa frente me olhou de cima abaixo e deu aquele sorriso com a boca meio apertada. Aquele sorriso de pena.


Olhamos para cima, e o céu estava preto. Olhamos de novo, e a névoa cobria o topo da montanha. Não dava pra ver nada. Uns segundos depois, estava chovendo ali mesmo. Ótimo. Mas é claro que nenhuma de nós, cabeças duras, queria desistir. Entramos no teleférico e, a cada metro mais perto do pico, minhas pernas bambeavam mais. O que danado a gente estava fazendo ali?


Sem carteira ou dinheiro ou cartão nos bolsos, uma vez que estávamos no pico, só havia duas alternativa de descida: a pé ou de sled. Assim que fizemos nossa primeira tentativa a bordo do sled, extremamente frustrada, e contemplei o penhasco que estava sempre à nossa direita, sem proteção nenhuma, pensei que sim!, havia uma terceira alternativa para descer: levada pelos paramédicos, com  pelo menos as duas pernas quebradas.

Os primeiros trinta minutos foram cabulosos, assustadores. A gente não conseguia dirigir aquela coisa de jeito nenhum! Sempre acabávamos indo para a direita, perto demais de rolarmos montanha abaixo. Nesse trecho inicial, o declive era grande mesmo, e realmente não havia muita neve desse lado direito da pista - nosso ponto fraco. Só depois é que a pista foi se estendendo mais pelos lados e dava pra sentir um certo alívio sabendo que, se caíssimos, cairíamos sobre a neve.


Cada vez que tentávamos deslizar mais um pouco, acabávamos perdendo o controle e caindo uma por cima da outra, e ambas por cima do sled, ou o contrário. Eu queria sentar e chorar. Apenas isso. E eu sei que Sarah também. Nenhuma de nós poderia prever que seria daquele jeito - ainda assim, assumimos que foi muita ingenuidade ter pensado que não teríamos problemas ali. Decidimos ir andando, e eu me movia na velocidade de uma anta com as quatro patas machucadas. O branco da neve doía nos olhos, eu via aura (aqueles pontos e figuras brilhantes) o tempo todo e estava só esperando o momento de torcer o calcanhar andando sobre o gelo com a minha bota DE SALTO (minha gente, DE SALTOOOO! não alto o suficiente pra eu ser a Gisele Bündchen, mas alto o suficiente pra incomodar).

Depois dessa meia hora, paramos em um restaurante pra eu ir ao banheiro. Olhei ao redor tentando reconhecer algum outro meio de transporte, mas nada. Quando pegamos a estrada nevada mais uma vez, as coisas começaram a melhorar. Eu descobri que podia ajudar a guiar o sled colocando minha mão nos apoios traseiros, em vez de deixar os braços na cintura de Sarah. O maior desafio de toda tentativa de descida era nos mantermos na pista e sobrevivermos aos "quebra-molas" que se formam nela. Não é divertido, não é engraçado. É doloroso. Um deles foi gigante o suficiente para mandar Sarah voando, mergulhando de boca na neve, e eu admito que ri com a cena. Desculpa, amiga!. (Chegando lá embaixo, ela contou que um deles foi gigante o suficiente pra quebrar uma vértebra de uma amiga ela - que graças a Deus não teve sequelas. Fiquei aliviada por ela ter me contado isso depois que sobrevivemos). Em um outro momento, passamos por tantas ondas e levantamos tanta neve que o rosto e a jaqueta de Sarah e ficaram completamente cobertos de neve. Ri disso também. Alto! E o que dizer da hora em que ela disse que estava fazendo xixi nas calças por causa do balanço? Amiga, me perdoa!

O cansaço maior estava nas pernas, sem dúvida. Além de mantê-las estendidas enquanto deslizávamos, elas eram nosso volante e nosso freio. E acredite em mim, você não vai querer saber o quanto dói ter seu calcanhar insistentemente esmagado em uma velocidade relativamente alta - ainda mais usando uma bota DE SALTO (onde eu estava com a cabeça?). A gente foi aos poucos se acostumando com as quedas e melhorando sutilmente nossas habilidades com o sled, mas ainda estava muito difícil. A chuva foi ficando mais forte. Eu vestia duas camadas de calças, mas Sarah tinha apenas uma. Seu jeans já estava encharcado, e em um momento ela confessou que não estava sentindo as pernas. Tava caro o preço a pagar pelas nossas cabeças duras.

Em um momento a gente de fato parou, contemplando o fracasso, e, sentadas no sled, oramos. Sério. Já estava desgastante demais, física e emocionalmente. Se não fosse Deus, quem mais ia ajudar a gente a descer? E de verdade, as coisas mudaram muito a partir dali! Conseguíamos guiar o sled por muito mais tempo (chegamos a dois minutos!), conseguíamos rir das nossas trapalhadas e depois que as coisas ficaram legais percebemos o quanto éramos sortudas de estarmos ali juntas. Tenho muitas amigas que, mesmo sendo maravilhosas e estarem no meu coração, não lidariam com aquela situação do jeito que Sarah lidou. Se fosse passar por isso de novo e tivesse que escolher alguém pra ir junto, eu tiraria a mesma Sarah da minha Pokébola. <3 A gente tava completamente focada na missão de chegar lá embaixo. E a animação chegou ao ponto de tirarmos foto! Uhul!




Quando chegamos lá embaixo, mal podíamos acreditar que finalmente havia terminado! Deve ter levado umas duas horas pra gente descer, mas nos momentos mais difíceis parecia uma eternidade nada agradável. Sério, que alegria quando terminou tudo... e que dor! Meus tornozelos ainda sofrem como se tivesse sido ontem, e Sarah ficou com uns roxos nas pernas que provavelmente não vai sair tão cedo. É engraçado que, naquele dia, eu estaria indo pra Munique, mas minha Gast teve um compromisso e precisamos adiar pro dia seguinte. Nada daquilo teria acontecido se o plano original tivesse dado certo. E de verdade, eu prefiro mil vezes do jeito que foi!


Clique na foto pra ver o vídeo! \o/
Se eu iria nas montanhas de novo? Com certeza! Mas no verão :D Hehehe...

É isso, gente! Tô vivíssima e adoro ter mais uma história pra contar. Amanhã eu falo da chegada em Munique e podemos finalmente colocar o blog com os dois pés (oi?) na Alemanha.

Beijo!